quarta-feira, 17 de fevereiro de 2021

Mãe D'água no Tambor de Mina

Nos salões de curadores e em alguns terreiros de Mina da capital maranhense, onde são realizados também rituais de Cura (pajelança), o termo mãe d´água designa freqüentemente o conjunto de entidades espirituais caboclas recebidas por um pajé ou curador, classificadas como linha de água doce. Designa também entidades femininas metade peixe e metade mulher, encantadas em poços e rios, como as que aparecem nas narrativas selecionadas para esse livro. A Mãe d´Água é representada iconograficamente de forma semelhante a Iemanjá, orixá das águas salgadas, representada nos terreiros de Umbanda e cultos afro-brasileiros como uma sereia do mar.

Acredita-se que a Mãe d´Água (sereia de água doce) exerce um magnetismo sobre as “crianças inocentes”, de até 7 anos, principalmente sobre as que não foram batizadas, pois ela é pagã. Deste modo, no interior ou na área rural, quando uma criança pequena desaparece, suspeita-se logo da Mãe d´Água. E, na cidade, quando uma criança que ainda não foi batizada tem pesadelo ou convulsão, aparece sempre alguém afirmando que isso é coisa de Mãe d´Água e procurando batizá-la de emergência, com a água do banho.

Existe na Mina, na encantaria de água salgada, uma versão masculina da Mãe d´Água sereia, o Dom Miguel, Rei da Gama, entidade espiritual encantada em um peixe - espadarte ou tubarão. Dom Miguel, que alí é conhecido como metade homem e metade peixe, é também apresentado como filho de Xangô, e sincretizado com São Miguel Arcanjo, daí porque sua festa é realizada no Terreiro de Jorge Itaci no dia 29 de setembro. Sua relação com São Miguel é afirmada na letra de algumas de suas “doutrinas”:

“Oi da baia, da baia do Pará,
da cintura prá baixo ele é um peixe,
da cintura prá cima ele é Miguel”
“Lá no mar ele é um peixe
e na terra ele é Miguel,
ele é o protetor das almas,
da balança do fiel”

Existe também na Mina maranhense uma entidade espiritual a cuja ação se atribui o desaparecimento de muitas pessoas que moram perto do mato (da floresta), o Surrupira. Essa entidade, que para alguns é o Curupira da mitologia tupi, pode também fazer as pessoas perderem a direção nos caminhos e se embrenharem em mata de espinho. Os Surrupiras têm grande atração por espinhos, pois moram nos tucunzeiros, palmeira cujas folhas são cheias deles. Fala-se também em terreiros de paraenses que, ao contrário da Mãe d´Água, os Surrupiras não gostam de água e, quando incorporados, se afastam quando alguém joga água nos pés do médium. A relação dos Surrupiras com o espinho aparece claramente na letra de várias de suas “doutrinas”:

“Minha coroa de espinho,
q´eu ganhei no espinheiro
Meu pai é Mata Zombana,
Surrupira verdadeiro”
(FERREIRA, E., 1985, p.55).

Por Adriano Figueiredo - Presidente da ACALUZ e
Diego Bragança de Moura - Historiador da ACALUZ
Texto Extraido do Livro - Maranhão Encantado - Encantaria Maranhense e outras histórias.
Todos os Créditos a Mundicarmo Ferretti.
#ACALUZ
Imagem. Meramente ilustrativa.