segunda-feira, 5 de agosto de 2019

Cabocla Herondina, uma Turca em Terras do Pará

Apresentação

A Associação Cultural Axé e Luz (ACALUZ) trás nesta terceira postagem um estudo mais abrangente da CABOCLA HERONDINA. Uma visão cultural de Família. Legado deixado em vida e que perpassou para encantaria como forma de aprendizado para raiz de cada estudo feito através das entidades turcas e do tempo compreendido entre vida e encante. Pela primeira vez estamos divulgando um vídeo em nosso site, que facilitará o estudo e aprendizagem. 

TAMBOR DE MINA FRAGMENTOS DE SUA ORIGEM


Em 1049, no Oriente, a primeira cruzada massacra os Turcos e toma Jerusalém, O Sultão Darsalam que significa “casa da Paz”, derrotado, envia suas três filhas: Mariana, Herondina e Jarina para África, em asilo na Mauritânia, as princesas, entretanto, nunca chegaram a África, pois a passagem pelo Estreito de Gibraltar, entraram numa dimensão diferente dos Encantados e foram parar na foz do rio Amazonas, chegando na aldeia do Caboclo velho, indígena onde Sumé um Encantado branco, que morava na aldeia a muito tempo vai embora prometendo voltar se fosse preciso Herondina encanta-se com a natureza e assumi a Jurema, assim tornando-se uma divindade turca Pindorama, forma-se assim o primeiro anel da cobra grande. As princesas vão até o baixo Maranhão e encontram Dom Sebastião, aquele mesmo que dizem que morreu na batalha de alcácer-quibir nas Cruzadas, o qual oferece a hospitalidade portuguesa à Turquia, uma vez que, Pindorama era colônia de Portugal, forma então segundo anel da cobra grande. 

Em 1719, Darsalam (que prometera lutar pelo seu povo foge para África atrás de suas filhas ou correndo e o mesmo fenômeno do Encantamento indo parar após quatro meses de sono na aldeia de caboclo velho). Vê os orixás e voduns (assim são chamados Encantados na Amazônia) acompanhando os escravos. Um vodun que estava à frente e que entrava nos terreiros para mostrar que as divindades africanas não deviam atender apenas ao povo africano, foi escolhido para fazer um filho numa escrava, cujo a cria chamou-se Anastácia, a qual fundou o primeiro tambor de mina de São Luís. 

Em 1889 para unificar o atendimento a todas as raças, convoca-se uma reunião com todos os Encantados de todas as etnias e Darsalam ver todas as raças reunidas dançando. Fechando desse modo o terceiro anel da grande cobra, Darsalam não ficou no Brasil, voltou para a Turquia onde de seu Palácio, até hoje, zela pelo seu povo. 

Como vimos, das filhas do Sultão Toy Darsalam, Herondina sobressai como a mais guerreira, independente e atrevida. Sua entrada na encantaria deu-se juntamente com a primeira leva de Turcos em busca de abrigo seguro nas terras da Mauritânia. Esta viagem nunca chegou ao destino, sendo eles levados ao portal tridimensional da encantaria. Ao chegar às terras encantadas brasileiras, não duvidou, embrenhou-se nas matas e foi a primeira turca a se ajuremar, ou seja, deixar os padrões turcos e se apossar da vivencia dos juremeiros. 

Já, nas terras encantadas de El Rei Dom Sebastião, nos Lençóis Maranhenses, a vida de ajuremada não se adaptou mais aos comportamentos de fidalguia, que provocou sua ida para o Reino de Dom João, Rei Junkal, que liderava guerreiros valentes bantus, encantados no oceano. No Junkal, Dona Herondina encontrou seu verdadeiro paraíso, de posse de uma grande região convive com os temerosos Fulupas, os surrupiras africanos, e seus animais sagrados: as misteriosas onças pintadas. Devido sua rebeldia, na época em que estava na África, seu pai o Sultão Dar Sa Allan, o teria deixado durante um longo período na aldeia de Camundá, cujas terras estão hoje na República Popular de Angola.

Os turcos continuaram com seus postos nas cidades do litoral. O conto do Maranhão, é que o Sultão Turco Darsalam, mantinha a esperança de reconquista das regiões perdidas. Sultão Darsalam resolve manter a chama do Sultanato salva com suas Filhas, as princesas Turcas (conhecidas no Brasil): Princesa Mariana – Princesa Herondina – Princesa Jarina. 

Que foram embarcadas para um reino amigo, na Mauritânia, mas nunca chegaram e os emissários esperaram por dias, meses e anos. 

Pela viagem conta-se que as princesas passaram pelo estreito de Gibraltar, conhecido como um portal sagrado a outras esferas, deixando o mundo real e material para entrar no mundo encantado. No “Rio das Amazonas”, foram despertadas do sono profundo, e encontraram a sacerdotisa Tapuya que chorava a perca de seus filhos: 

“Minhas lágrimas são o Rio.... Eu sou a barreira do Mar (Marajó), Eu sou a Pororoca, defendo meu povo contra a maldade que chega do mar, mas vocês princesas turcas podem entrar nestas Terras, (Recepção da Pororoca). 

Os contadores dizem que elas entraram em uma região elevada onde quem entra jamais pode sair. 

Estes portais e dimensões existem no popular do Maranhão em: 
• Matas 
• Espelhos de água 
• Rochas 
• Cavernas 
• Vários locais e países 

Ninguém sabe o local certo, que pode mudar a todo instante quando assim deseja. 

Alguns estudiosos do Brasil, se baseiam na existência de alguns fatos históricos que afirmam que, no início de 1500 o Espanhol Vicente de Pison, visitou o litoral atlântico do Pará e levou uma grande quantidade de escravos indígenas para a Europa, talvez por estes motivos a Sacerdotisa indígena que recebeu as Princesas Turcas, chorava e chora até hoje transformada em Pororoca. 

Entre os povos da Amazônia representa a Pororoca “Defesa contra estrangeiros”, estes que desejam invadir a cultura e a influência da mata. 

Conta-se que a Princesa Jarina, não estava contente com as matas do Pará e se escondeu na Corte de El Rei Dom Sebastião de Portugal, Mariana voltou ao mar para as esquadras de guerra e Herondina embrenhou-se na mata por ter se identificado com a cultura indígena. 
Entre a lenda e a realidade cultural se encontra as misturas e verdades históricas. 

O Palácio de Dom Sebastião, se encontra a 160 Km de São Luís no arquipélago de Maiaú. 

Sua festa se dá exatamente no dia em que raiou na crôa de cada filho desta linda entidade cabocla; nós cultuamos Dona Herondina no dia 05 de julho de cada ano. Suas cores são a da Turquia, Verde, Amarela e Vermelha, os cabos são verdes e as cristalinas grenás. 

Cantiga - I

No mar tem flores tem rosário de nossa senhora (bis)
Arueira de São Benedito 
Cabocla Herondina chegou nesta hora (bis) 

Mundicarmo Ferret em sua dissertação de doutorado, Desceu na Guma, nos fala que conforme história contada em São Paulo pela Cabocla Mariana, incorporada em Pai Francelino de Xapanã(in memoria), o Rei da Turquia vendo-se quase derrotado em uma batalha, mandou preparar um navio para levar para longe três de suas filhas: Mariana, a mais velha, Jarina, a mais nova e outra cujo nome preferiu não revelar (supostamente Herondina). O navio teve sua rota desviada devido a uma tempestade e naufragou antes de chegar em porto seguro (ou Porto Seguro?). As princesas turcas foram salvas por Rei Sebastião. Jarina, como era muito nova, ficou com ele e passou a ser conhecida como sua filha. Mariana, a mais velha, sendo muito ‘revoltosa’ e acostumada a acompanhar o pai nas batalhas, organizou uma esquadra e voltou para a Turquia mas, chegando lá, recebeu a notícia do fim da guerra e derrota do seu povo - daí a música: 

Cantiga - II
“Fala Vodun, Senhor João de Imbarabaia. 
Prenderam o turco, nosso rei de Imbarabaia. 
Vodun chorou e no romper do dia. 
Desceu na guma, Imperador Rei da Turquia.” (existem várias versões). 

Uma Homenagem da ACALUZ ao Babá Tayandô - Belém do Pará. Que divulgou esta história para o Mundo. Abaixo veremos um vídeo produzido e narrado por ele.

CONHECENDO UM POUCO MAIS DA VIAGEM DOS TURCOS ATÉ A CHEGADA AO BRASIL EM TERRAS DE ENCANTARIA. 

Conta a história que Rei da Turquia era o mais cotado para assumir o comando de um grande império mas, como não era romano, não foi aceito, os romanos, achavam que ele não podia ser rei e os turcos se revoltaram. Começou uma grande disputa entre ele, a família dele e a de Dom Manuel, que era romano. A guerra demorou muitos anos e envolveu muita gente. Havia Dom Francisco, Dom Felipe... Os turcos ganhavam, perdiam, perdiam, ganhavam... Rei da Turquia tinha uma irmã e uma filha muito envolvidas também na guerra. A irmã dele (Floripes) se “perdeu” e ligou-se a grupos diferentes, casou com Guy de Borgonha. A filha era Dodô, Rainha Douro, que era conhecida pelos outros como Joana d’Arc. Ela era vidente - sabia das coisas e avisava o pai e a tia - mas foi acusada de bruxaria. Na guerra, muitos que não eram da família foram ligando-se ao Rei da Turquia e este recebeu todos os que lutaram com ele como filhos. Ao todo, Rei da Turquia teve três famílias: Ferrabrás (a legítima), Borgonha e Ramos. Segundo Pai Euclides (FERREIRA, E. 1989:2), a primeira delas é chefiada pela Rainha Douro (sua filha), a Borgonha é chefiada pela Princesa Floripes (sua irmã), e a Ramos é chefiada por Caboclo Velho. Mas todos os turcos obedecem a seu irmão mais velho, Guerreiro de Alexandria, como também a Tabajara de Alexandria que, atualmente, como ‘invisível’ é o responsável pelo Terreiro da Turquia, no lugar de seu pai (pois, além de ser recebido pelo zelador da casa, assumiu o comando do terreiro após a morte de sua fundadora, que recebia o Rei da Turquia). O Rei da Turquia veio para águas maranhenses no navio encantado de Dom João - de quem era primo. O navio aportou em São Luís e ele foi dar uma volta pelo Outeiro da Cruz (marco da batalha em que os holandeses foram expulsos do Maranhão). Quando voltou, viu que fora atraiçoado por Dom João e que o navio já zarpara. Ficando ali, passou algum tempo andando pelo Outeiro da Cruz (bairro de onde o terreiro da Turquia nunca saiu, apesar de ter mudado de lugar três vezes) e depois afastou-se bastante. Continuando a andar, o Rei da Turquia chegou à aldeia de Caboclo Velho, o índio Sapequara, no Baixo-Amazonas. A aldeia estava em festa e ele gostou muito, achou a festa muito bonita. Caboclo Velho convidou-o a juntar-se a eles e Rei da Turquia resolveu ficar ali com todo o seu grupo. Depois, para serem mais bem aceitos na aldeia, muitos turcos adotaram nomes indígenas - Ubirajara, Tabajara, Jaguarema, Iracema... (Antes eram Francisco, Bartolomeu, Felipe). Rei da Turquia e Caboclo Velho tornaram-se muito amigos, quase irmãos, e cada um adotou filhos do outro. Por isso muitos pensam que eles são irmãos. 

Caboclo Velho já ‘bradava’ nos terreiros de São Luís e os turcos entraram na Mina com ele, como caboclos, apesar de não serem propriamente caboclos. Depois de algum tempo, Rei da Turquia e Dom João encontraram-se (ali?) e tornaram-se amigos - no Terreiro da Turquia um batizou filho do outro, tornando-se duplamente compadres. Numa outra versão do mesmo “mito”, o Rei da Turquia veio com Dom João, mas os dois saíram para um passeio e chegando na aldeia de Caboclo Velho, que estava em festa, o Rei da Turquia gostou da festa e ficou lá, enquanto Dom João foi embora. Conta-se também em São Luís que Dom João foi com Dom José a uma festa na aldeia e o segundo gostou muito da festa e foi entrando enquanto o outro foi embora só - é por isso que Dom José passou a vir (na Mina) como caboclo e Dom João como gentil (C.P. - Casa Fanti-Ashanti - Entrev. 07/1988). Segundo Pai Euclides, o Rei da Turquia tinha três esposas, uma em cada lugar em que guerreou, mas só se costuma falar o nome de uma delas, o da Rainha Leonor. As outras, segundo o mesmo informante, são ligadas ao seu lado português e francês (pois é primo de Dom João e Dom Luís). 



Cantiga - III
“Estava em terra de Mouro, Rei do Mar me chamou. Quem faltou na guma, Rainha Leonor”. 
(FERREIRA, E. 1985:47). 

Como Douro - a filha mais velha do Rei da Turquia, a quem seus filhos mais novos chamavam de mãe - é Joana d’Arc, não é difícil concluir que uma daquelas suas esposas, sobre quem nunca se fala, é francesa. Mas há quem afirme na Mina maranhense que Douro é irmã e não filha do Rei da Turquia. Fala-se também em terreiros maranhenses que a outra esposa do Rei da Turquia é Maria de Alexandria, e que esta é lembrada em uma de suas doutrinas cantadas no Maranhão de forma diferente da que é conhecida em terreiros de paraenses: 

Cantiga - IV
“Para vodum, Senhor João Marambaia, 
Mataram o turco, ficou o rei do Paraguaia... 
Turco chorou, no romper do dia. 
Mataram o turco, senhora Dona Maria”. 

É possível que, para alguns ‘mineiros’, a Dona Maria que aparece na letra da ‘doutrina’ apresentada não seja Maria de Alexandria e sim Mariana, filha do Rei da Turquia que vem também na Mina do Pará como Maria de Mariá (SILVA,A.V. 1976:221). 

Embora haja acordo entre os ‘mineiros’ em relação ao número de famílias do Rei da Turquia, alguns, como Pai Jorge (OLIVEIRA, J. 1989:47), falam que o nome delas é Ferrabrás, Ramos e Mouro (e não Borgonha) e outros como, muito ligada ao Terreiro da Turquia, dizem que as três famílias daquele turco são: Alexandria (e não Ferrabrás), Ramos e Borgonha. Segundo Pai Euclides, talvez os turcos não revelem seus verdadeiros nomes por causa de suas ligações com o paganismo. São conhecidos por nomes que falam de sua origem ou de suas façanhas, A adoção de nomes indígenas foi uma prática muito adotada no Brasil, próximo à sua independência de Portugal, e tem alguma coisa a ver com o romantismo da época. 

Fizemos este adendo ao texto para destacar que as filhas do rei da Turquia, na verdade são adotadas pela Rainha Douro, sendo filhas de um único pai, mas de mães diferentes, tentamos de alguma maneira tentar localizar as supostas mães, e chegamos em três mães, Rainha Leonor (esposa do Rei da Turquia), Rainha Douro (mãe de criação, irmã do Rei da Turquia, a única que podemos afirmar que é mãe de fato, já que criou todos e todas) e Maria de Alexandria, supostamente Maria Padilha Cigana, esposa do Rei da Turquia de origem Cigana e Francesa, Mãe de Herondina apenas. Por este motivo temos uma doutrina que lembra seu lado Padilha, Exu Mulher: 

Cantiga - V
Herondina é moça má 
Deu três gargalhadas no céu... 
Deu três, deu três, deu três gargalhadas no céu.


#ACALUZ 

Ref. 

1.     www.acaluz.com  - 2013 as 16h00 – Adriano Figueiredo, Toy  Nochê Vodun Kaleuan – Nagô Gentil;
2.     David Thomaz Alcântara – Vodunon Tambor de Mina Nagô – 2018 as 11h00.
3.     Mundicarmo Ferretti - Desceu na Guma:  O caboclo do Tambor de Mina no processo de mudança de um terreiro  de São Luís: a Casa Fanti-Ashanti – 1996.
4.     https://www.semeadura.com/news/a-encantaria-amazonica-na-umbanda-parte-ii:-as-tr%C3%AAs-irm%C3%A3s-da-lingua-ferina – 2018 as 18h00.
5.     MOURA, Glória. Batuque no quilombo. Brasilia: FUNTEVÊ, 1988. Nascentes Negras da Música Brasileira - vídeo.
6.     OLIVEIRA, Edilson M. Terreiro de Mina Dois Irmãos, antigo Tambor de Santa Bárbara: histórico. Belém: [(s.n.)], 1990. Distribuído no centenário no terreiro.
7.     OLIVEIRA, Jorge Itaci de. Orixás e voduns nos terreiros de Mina. São Luís: VCR Produções e Publicidades, 1989.
8.     OLIVEIRA, Waldir F. e COSTA LIMA, Vivaldo da (Org.). Cartas de Edson Carneiro a Artur Ramos: de 4/1/1936 a 6/12/ 1938. São Paulo: Ed. Corrupio, 1987.
9.     PEREIRA, Manoel Nunes. A Casa das Minas: contribuição ao estudo das sobrevivências do culto dos voduns, do panteão Daomeano, no Estado do Maranhão-Brasil. 2.ed., Petrópolis: Vozes, 1979. Edição original de 1947. PRANDI.